17 de fevereiro de 2017



Tédio, segundo o Aurélio, é sinônimo de aborrecimento, fastio, nojo, desgosto. É aquele fazer nada que para muitos é aterrorizante. O tempo vazio assusta homens e mulheres, indistintamente. Uma pesquisa da Scientific American, divulgada em reportagem do El Pais, aponta que após 15 minutos em um lugar fechado, 66% deles e 25% delas preferiram receber uma descarga elétrica a ficar sem ter nada para fazer. Mas, embora muitos custem a acreditar, o fato é que, sim, o tédio é importante. Curtir aquele momento sem estímulos, de olhar para o nada, de sequer observar o que está a nossa volta pode fazer bem para a saúde física e mental.

Mas de onde vem esse vazio, essa condenação social provocada pelo fazer nada? O psicólogo Flávio Gikovate ensinava que, desde Pascal, já havia a ideia de que os seres humanos precisavam se distrair, se divertir. Nesse sentido, todo tipo de ocupação, esportes, trabalho, tudo, tudo podia ser incluído. A ideia era impedir a desocupação a qualquer custo, evitando também angústia e medo. Tédio, na visão do filósofo cristão, era um tipo de depressão, de tristeza, de falta de sentido na vida. A atividade nos faria esquecer que somos mortais e, também, o que motivaria tristeza e amargura. Quando ocupados, ficaríamos livres de tais sentimentos.

“Nada melhor do que não fazer nada...”, canta Rita Lee. O problema é que dificilmente procuramos curtir esse momento de ficar completamente à toa de braços e pernas para o ar. Se estamos no sol, ao invés de aproveitarmos o momento, imaginamos o quanto de vitamina D estamos recebendo, se a tonalidade da pele vai ficar mais ou menos bonita, e por aí vai. No mesmo El Pais, o psicólogo Rafael Santandreu defende a necessidade de voltamos a ter prazer em desfrutar esses momentos. Ele explica que o tédio faz parte de nossa natureza, nos põe em um estado mental de calma e é um grande ativador de grandes tarefas, da criatividade.

Se, no caso do ócio, não fazer nada é uma decisão, no tédio falta sentido para as possíveis atividades que estão ao nosso alcance. “No ócio não há tédio. Há tédio quando somos obrigados a nada ter o que fazer, quando somos obrigados a esperar que o tempo passe”, explica o escritor Yves de La Taille, em Cultura do Tédio. Esse processo, lembra ele, é natural na vida de todas as pessoas. Aguardar em uma fila no banco ou no supermercado, esperar por uma pessoa que demora a chegar, um trem, um avião, um médico, deitados após uma cirurgia... É um processo natural e para o qual devemos estar preparados.

Santandreu relaciona a má fama do tédio com a sociedade do consumo e do ócio, que quer que sempre estejamos “ocupados ou fazendo coisas emocionantes”. Para ele, uma questão importante reside em como nos relacionamos com esse momento. Se, em pequenas porções, faz bem, em doses elevadas pode ter efeito contrário. Crônico, o tédio pode levar à depressão, ansiedade, comportamento agressivo, dependência de álcool e drogas, irritação, entre outros, como explica Santandreu.

Talvez por isso mesmo exista essa certa fobia de tédio na sociedade. “Não existe o excesso de tédio”, afirma ele. “Existe uma má vivência do estar entediado.” Como analogia, pode-se comparar ao que ocorre com o supersticioso. Se acredita que passar debaixo de uma escada vá fazer mal, passará mal toda vez que isso ocorrer. Mas isso não significa que, de fato, terá qualquer má sorte.

Leila
CVV Brasília (DF)

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